segunda-feira, 26 de março de 2012

Com muito azar, com muita sorte

OBS.: Este post foge do motivo original do blog. Mas faz parte de ser intercambista! Ou de ser eu...

Desci do ônibus e puxando a mala olhei pra trás. De repente berrei em prantos dando o último aceno, vendo a bandeira brasileira que tínhamos pendurado na janela pra que fosse a cortina mais linda do ônibus.

Estávamos em Kouvola, cidade onde eu e mais quatro intercambistas foram deixados para pegarem seus respectivos trens e seguirem seus destinos. Só o Arata, japonês, percebeu que eu realmente estava chorando embora eu estivesse dando um escândalo. Foi uma viagem linda, num lugar incrível, com pessoas que se encontraram nessa vida por um baita dum acaso, por sorte. Ou azar... já que é neste momento de se despedir e ir pra “casa” que começamos a pensar que o que estamos vivendo aqui é um período e aquelas pessoas, quando este período chegar ao fim, não mais farão parte das nossas vidas como agora. Fui comprar a passagem do trem para Lappeenranta com a cara inchada de tanto chorar e ainda soluçando.

Mas aí... vem a parte cômica da história.

Minha host family está neste momento na Suécia e só voltam segunda-feira. Viajei quinta e na sexta-feira eu já sabia que tive o azar de esquecer a chave de casa e podia imaginar que um remoto probleminha estava por vir...

Eu sou daquelas que empurro com a barriga. No fundo, no fundo eu SINTO que há uma solução e só me desespero quando nem a minha imaginação criativa pode intervir. Este não era o caso... e simplesmente segui viagem aproveitando a Rússia, rindo, fazendo folia na rua, ônibus, hotel, restaurante etc. Que delícia!! Afinal eu tinha sorte de estar na Rússia com um bando de intercambista, né não?

Mas... tudo que é ruim chega ao fim - tal qual faz o que é bom. E então desci do trem, de volta a Lappeenranta, andei arrastando aquela mala pesada por cima da “areia” (umas pedrinhas que são espalhadas quando a neve está derretendo nas calçadas para torná-las menos escorregadias) até a parada de ônibus. Aliás, não sei pra quê uma mala tão grande para tão poucos dias... Esta sou eu.

Enfim, o azar era que eu só tinha rublos e deixei pra resolver esse problema quando eu chegasse na parada de ônibus e... a sorte foi que encontrei cinco euros no bolso da minha calça. Deixei pra decidir como o meu problema de entrar em casa sem chave seria resolvido quando cheguei à minha rua. Meu cérebro começou a maquinar.

PLANO A

Eu podia bater na porta dos nossos vizinhos e perguntar se eles têm uma chave extra da nossa casa para casos urgentes,

SORTE: Isto é comum e normal aqui na Finlândia (na Europa em geral).

AZAR: Estes vizinhos também estão na Suécia já que o motivo da viagem é a Liga de Bandy na qual meu irmão vai jogar e os filhos dos meus vizinhos também fazem parte do time do meu irmão! Então logo perdi as esperanças quando me lembrei deste detalhe.

PLANO B

Procurar uma chave extra escondida em lugar estratégico.

SORTE: A maioria das famílias tem um lugar no qual seus membros combinam de “esconder” uma chave extra para momentos como este no qual eu me encontrava.

AZAR: Minha host family não entrou na estatística.

PLANO C

Ligar para uma amiga e ser salva por um teto, banho, comida e uma cama bem boa...

AZAR: Celular sem bateria.

SORTE: Encontrei uma tomada do lado de fora da casa. Estranho.

Botei o celular pra carregar ali e segui com o Plano D, cheia de esperanças.

Em desespero, esperando por um milagre, olhei pra varanda da minha casa decidi subir as escadinhas de metal e quem sabe abrir a porta da frente por dentro depois de conseguir entrar. Aí eu podia pegar a mala de boa na lagoa...

Mas o azar é que a porta tava trancada, como todas as outras demais portas dos Planos E, F, G e H.

O Plano C também não deu certo porque todos que eu ligava não atendiam o telefone/estavam com o telefone desligado. A única que atendeu foi a minha amiga russa, adivinha? Ela estava na Rússia!! Não me diga, que azar.

Como ninguém da minha família atendia o celular e sempre caia na caixa postal em sueco, entrei em desespero e comecei a pensar na hipótese de passar esta noite ali na casinha da garagem ou no quartinho guarda-tralha, as duas únicas portas que consegui abrir e que não tinham ligação alguma com a parte interior da casa. A ideia era me proteger do frio... mas e a tensa vontade de fazer xixi? Quase recorri ao matinho...

Matinho onde nesse quintal cheio de neve? OH JAH

Dei a volta na casa e então pensei em subir a escadinha que dava pro quarto do meu irmão no segundo andar, aquelas escadinhas que eles creem que é para escapar de incêndios...

Veio a minha consciência e disse “arranje um plano menos perigoso”.
Recorri ao plano mais seguro e liguei pro meu conselheiro, ele nem sempre atende o celular, então eu nem tinha muitas esperanças... mas por sorte ele atendeu e lá estava eu pegando outro ônibus para voltar pro centro. O azar é que é domingo e no domingo os ônibus passam apenas de uma em uma hora. Esperei anos...congelando no frio.

O combinado com o meu conselheiro era nos encontrarmos no porto e dali em
diante ele me levaria pra casa dele onde eu poderia passar a noite. MAS... quando cheguei no porto, depois de arrastar a minha mala pesada pelas pedrinhas que obstruíam o caminho, a ligação nunca completava porque ele não atendia o celular!! Eu estava quase explodindo de vontade de ir no banheiro e então o jeito foi SUBIR A LOMBA ARRASTANDO AQUELA MALA... até alcançar o Coffee House, um café que fica aberto faça chuva, faça sol, domingo ou feriado, cujo banheiro eu nem sabia se era grátis porque eu geralmente não frequento aquele café.

Foi uma luta entrar com a mala nas escadinhas do café. Eu já não tinha como me esforçar mais e graças a isso o frio não estava tão tenso. Mas eu já estava desesperada, achando que ia ter que enrolar a noite toda, ficar naquele café até meu conselheiro voltar a atender o telefone – o que eu na verdade não acreditava que aconteceria, portanto na minha cabeça eu ficaria ali até o café fechar.

Mas a sorte ganhou, e vi minha host-vó sentadinha em uma das mesas com um jornal nas mãos, tomando um chazinho e sorrindo pra mim! Ela não fala inglês e depois desses dias sem contato com o finlandês eu custei a lembrar inclusive das palavras básicas... mas com esforço contei pra ela a história da chave esquecida, pedi para dormir na casa dela e então...

– Nosso ônibus sai em quinze minutos!

2 comentários:

  1. O jeitinho Brasileiro sempre está presente...
    Fiquei nervoso por você lendo o post! hahaha

    Tem que ter aquela emoçãozinha né... Senão perde a graça!

    Grande Beijo,
    MK

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  2. Nossa Juliaaaaaa que doido... ainda bem que tu é brasileira e deu um jeitinho né!!!

    Que sorte sua host vó está la... parece até filme!!!

    Beijão

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